O Relatório Steyn

Relatório secreto envolve Portugal como esconderijo de armas do ‘apartheid’

E PORQUE SERÁ QUE EM PORTUGAL, IMPRENSA, TRIBUNAIS, FORÇAS POLÍTICAS, NINGUÉM DEU A MÍNIMA ATENÇÃO A ISTO?
QUEM FORAM OS DOIS OPERATIVOS PORTUGUESES EXECUTADOS? ONDE? QUANDO? POR QUEM? PORQUÊ?
ONDE EM TERRITÓRIO NACIONAL FORAM DEPOSITADAS TAIS ARMAS? QUEM GUARDOU? QUANDO?

Um relatório secreto The Steyn Report (elaborado pelo general Pierre Steyn) para o último presidente do regime do apartheid na África do Sul, Frederik de Klerk (na foto), envolve também Portugal. Em território português terão existido depósitos de armamento a serem utilizados por uma ‘terceira força’ manobrada pelos serviços militares da África do Sul, no sentido de desestabilizar o período de transição naquele país um provocar um golpe de estado. E o SIS o que anda a fazer, para nada ter descoberto ou divulgado?

A peça que aqui apresento é baseada em excertos surgidos em orgãos de informação sul-africanos e internacionais Sunday Independent / Guardian Mail / Pretoria News / AFP / Gulf Times / Al-Jazzeera / GreenLeft). Só agora tal relatório é tornado público pela primeira vez, conforme esclarece o Sunday Independent, publicado na África do Sul.

O Relatório Steyn, compilado por um general de topo do antigo regime do apartheid para De Klerk, pormenoriza como as forças armadas auxiliaram a desestabilizar o país durante os primeiros anos da turbulenta década de ‘90. E os factos agora tornados públicos acabam por mostrar que na posse de todos esses elementos, De Klerk acabou por dar cobertura à maior parte dessas manobras de conspiração:


F.W. de Klerk recebeu o relatório cerca de ano e meio antes das históricas eleições de Abril de 1994, e era já aqui devidamente detalhado o papel do aparelho militar numa denominada ‘Terceira Força’, uma obscura aliança de agentes governamentais e membros do Partido Inkatha responsáveis por actos de terror em larga escala, bem como pela manipulação de elementos do Congresso Pan Africano lançados contra membros do ANC.


Toda esta violência é desencadeada a partir do momento em que o movimento de libertação sul-africano deixou de estar banido em 1990 e prosseguiu até às eleições. Em vez de tomar alguma medida contra os seus autores (de tal violência) De Klerk nomeou oficiais de topo do aparelho de defesa, e envolvidos em tal campanha de terror, e devidamente nomeados neste relatório, para investigar essas mesmas alegações!


Os primeiros detalhes deste relatório começaram a vir a público em Janeiro último quando se registou uma fuga de informações no respeitante a documentos entregues à TRC - a Comissão sul-africana de Verdade e Reconciliação. De notar porém que este mesmo relatório se tem mantido secreto desde Dezembro de 1992 quando o general Pierre Steyn, então chefe de estado maior das forças de defesa, apresentou os seus dados ao presidente Frederik De Klerk, que acabaou por negar a revelação de detalhes ou que existisse sequer uma versão escrita do mesmo.


E, chegado o ANC ao poder, o próprio Nelson Mandela achou por bem ocultar o conteúdo deste mesmo relatório, receando que o mesmo viesse a incendiar ainda mais os ânimos e a colocar em perigo a ‘reconciliação nacional’.


De Klerk nomeara Steyn no sentido de investigar o papel desempenhado pelos militares na violência política após uma Comissão Goldstone Commission - encarregue de investigar essa chamada ‘Terceira Força’ - ter efectuado uma rusga à sede do ‘Directorate of Covert Collection’, um orgão pertencente aos serviços de Inteligência Militar, em Novembro de 1992.


A Comissão de Verdade e Reconciliação revela afinal que o general Pierre Steyn apresentou mesmo em versão escrita um relatório de trabalho ao presidente De Klerk, identificando que departamentos e ofociais do aparelho militar estavam de facto envolvidos em actividades ‘ilegais’ ou ‘não autorizadas’. Existia já um sumário, deste relatório Steyn, editado a 31 de Janeiro último pelo Weekly Mail and Guardian, que revelava entre outros pontos que:


“O relatório contém uma listagem de militares e outros suspeitos que, uma vez trazida agora a público, implica que haja pressões sobre as autoridades para que os mesmos transgressores sejam levados à justiça”.


Dá crédito às alegações desses anos, ligando o exército e polícia do apartheid a várias estruturas ‘para-estatais’, geralmente apelidadas de ‘terceira força’, e que orquestravam uma campanha de violência contra movimentos de libertação e cidadãos negros comuns. Milhares de indivíduos, maioritariamente negros, pereceram durante tal campanha que antecedeu as primeiras eleições democráticas em 1994, sendo parte dos ataques lançados contra comboios suburbanos ou albergues de trabalhadores.


Sistematizando, o relatório Steyn reporta ainda, entre outras alegações, que:


· as forças armadas do regime do apartheid arranjaram esconderijos ilegais de armas em Portugal, armamento que seria usado na desestabilização inerna sul-africana;
· mantiveram igualmente depósitos de armamento secretos tanto na África do Sul como em países vizinhos;
· foram emitidas ordens de eliminação para dois operacionais portugueses detidos;
· foi providenciado treino militar a movimentos de resistência em países vizinhos;
· oficiais do aparelho militar sul-africano do tempo do apartheid conseguiram dar ordens a operacionais ao moviemento de extrema-esquerda Congresso Pan-Africanoa para assassinarem membros do Congresso Nacional Africano; e
· oficiais de topo do exército do apartheid estiveram envolvidos num plano para um golpe de extrema-direita.
· houve congregação de esforços entre unidades de elite, tanto de reconhecimento como de ‘informação’, das Forças de Defesa, com organismos de segurança dos caminhos de ferro estatais, para o espalhar da onda de violência na rede ferroviária suburbana de Johannesburg em que morreram centenas de trabalhadores negros;
· que o batalhão médico das Forças de Defesa forneceu venenos e materiais químicos que foram usados por equipas de eliminação, contra ‘inimigos do estado’;
· operações encobertas em países africanos vizinhos, incluindo armazenamento secreto de armas no Quénia, Zâmbia, Ilhas Maurícias, e outros países não identificados, para serem usados pelas forças especiais do aparelho de segurança no sentido de desestabilizarem esses países. Armamento foi tambéme scondido em reservas de caça no inteior da África do Sul. As Forças de Defesa também orquestraram alguns golpes de mão contra bantustões ‘independentes’;
· agentes militares armaram e treinaram elementos da Renamo de Moçambique, bem como os esquadrões da morte do Inkatha Freedom Party;
· as Forças de Defesa participaram no comércio e tráfico ilegal de armas, marfim e chifres de rinoceronte;
No seguimento da apresentação deste ralato pelo General Pierre Steyn a De Klerk em 1992, alguns elementos de topo no aparelho militar e outros orgãos de segurança foram removidos de funções ou reformados, segundo afirma o Sunday Independent. Mas subsequentemente, porém, pouco ou nada do relatório foi tornado público, continua o jornal. E críticos que antes pertenceram ao aparelho de ‘inteligência’ afirmaram que a maior parte das alegações nunca foi provada e que o relatório acabou por ser empolado por ressentimentos.
Na prática, talvez não tivessem até ocorrido grandes mudanças de fundo, contando com um certo beneplácito de De Klerk: Steyn recomendara que ao General Kat Liebenberg, então à frente das SADF - Forças de Defesa Sul-Africanas, o General George Meiring, então chefe do Exército, e o General Joffel van der Westhuizen, chefe da Inteligência Militar, fosse “pedido que se reformassem, ou se procedesse à sua reforma compulsiva ou expulsão das fileiras se necessário”.
Só que em vez disso De Klerk acaba por pedir precisamente a esses três que compilem uma lista do pessoal militar que pensem dever ser removido do activo! Pouco depois, De Klerk demite ou passa compulsivamente à reforma 23 elementos seniores das forças de defesa. Excusado dizer que nem, Liebenberg, ou Meiring ou Van der Westhuizen se encontram entre eles! E logo depois, 15 desses 23 quadros acabam por ser reintegrados. De Klerk recusa elaborar sobre as razões que o levaram a efectuar tais movimentações, e continua a negar a existência dessa ‘terceira força’, contra todas as evidências.
O vice-presidente da TRC - Comissão de Verdade e Reconciliação - afirmou à edição de 17 de Janeiro do Weekly Mail and Guardian que é um facto “extraordinário” que os três generais que Steyn queria investigados, acabaram por ser precisamente os mesmos a quem De Klerk pediu para identificarem os operacionais dessa “Terceira Força”.

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